Crônica: A ponte da Charqueada

Manoel Gandra (de Formiga/MG)

Crônica: A ponte da Charqueada
Manoel Gandra é poeta e jornalista




“Muita gente tentou, mas só ele conseguiu”.

Era assim que os correligionários do ex-prefeito Ninico Resende carteavam marra quando falavam da construção da ponte da Charqueada, aquela que liga os bairros do Quinzinho e Santo Antônio.

Por mais de uma vez, outros prefeitos tentaram erguer a ponte, mas, no meio do caminho, as armações sempre eram levadas pela água (os adversários políticos de Ninico brincam que a ponte não caiu por causa da quantidade de cimento. Com mais cinco sacos, dizem, ela se transformaria em barragem).

Assim que ficou pronta a obra, Ninico quis que a inauguração fosse do mesmo porte. Tinha de ser algo monumental. Era para ter palanque, banda de música, churrascada e chopada à vontade. O foguetório tinha de desfalcar a maioria das fábricas de Santo Antônio do Monte. Tudo pronto, tudo certo.

Foi aí que deram uma idéia a Ninico: chamar alguém que utilizaria diariamente a ponte para que pudesse falar dos benefícios que ela traria. E dentro da Prefeitura havia a pessoa ideal, o radialista e comunicador Aureliano Pinto (Landico), que trabalhava no Centro e residia no Santo Antônio (até hoje ele mora no mesmo lugar).

Acontece que, na noite anterior à inauguração, Landico foi convidado pelo também locutor e funcionário municipal Mário Murari para uma feijoada. Landico ficou até tarde. Ao voltar para casa, começou uma dor de barriga das piores. Ele teve uma diarréia e passou a noite no banheiro.

Quando se levantou pela manhã, não conseguiu sequer fazer o seu programa pela “Difusora/AM”. Para as 9 horas, estava marcada a inauguração e o radialista não poderia deixar de ir, seria uma desfeita.

Landico ficou sem comer nada, tomou um banho e foi para a inauguração. A multidão era enorme. Ninico chegou nos braços do povo e não fez questão de apressar as comemorações. A Banda São Vicente Férrer tocava, crianças levavam balões e os carrinhos de pipoca faziam a festa. De repente, Landico nota que alguma coisa não está boa. Cruza as pernas e nada de os discursos começarem. Ficava cada vez mais incomodado, mas foi segurando.

Foi demorando e a dor de barriga só aumentando. E, finalmente, começaram os discursos. Fala um, fala outro, tudo muito rápido. Landico seria o último, logo após Ninico.

Ao fazer uso da palavra, Ninico, que já tinha tomado uns chopinhos, se entusiasma e nada fazia ele parar. Foi aí que ele viu que Landico estava quietinho em um canto. Ninico o chama para a frente do palanque e nota que ele está até azul. O suor pingava e de seus olhos saíam lágrimas.

__Olha gente, dizia Ninico, é bom ver o quanto a população está emocionada. Vejam só, o Landico está até chorando. É muita emoção. Não chore não Landico, pois as obras serão várias.

Mário Murari, que estava do outro lado do palanque e sabia de tudo, se ajoelhou de tanto rir. Landico falou poucas palavras e a festa acabou.