Crônica: Boi D’água

Manoel Gandra (de Formiga/MG)

Crônica: Boi D’água
Manoel Gandra é poeta e jornalista




Boi D’água. Não teve ninguém que soubesse contar o verdadeiro nome do mais popular e carismático padeiro que Formiga já teve.

Lá pela década de 50, a cidade acordava com o grito do Boi D’água pelas ruas: “Óia o pão! Óia o pão!”. Ele era daqueles padeiros que saíam pelas ruas oferecendo a mercadoria. Nem tinha dado cinco da madrugada e lá estava ele na porta das padarias para pegar a primeira fornada. Enchia um grande balaio, colocava na cabeça e saía. Levava no ombro um cavalete para descansar o balaio para melhor atender à clientela. 

__Óia o pão!

Era um grito e uma janela aberta. Não havia quem precisasse de despertador com o “Óia o pão!” do Boi D’água.

Uma vez, era madrugada de uma segunda-feira de janeiro, Boi D’água tinha acabado de encher o balaio na Padaria do Bacalhau. Subiu para o Bairro da Chapada e quando ia chegando perto da Avenida Abílio Machado, notou que algumas moedas que levava para o troco tinham sumido.

Encostou-se no muro do Cemitério do Santíssimo, baixou o cavalete e colocou o balaio por cima.  Debaixo da luz fraca de um antigo poste, enfiou a mão no bolso para procurar o dinheiro.

Do outro lado do muro, o coveiro Chico da Lica, que tinha levantado mais cedo para abrir uma sepultura para um enterro marcado para as nove horas, ouviu o barulho do cavalete. Subiu em um túmulo e de cima do muro falou pro padeiro:

__Ô Boi D’água, me dá um pão.

O pobre coitado quase morreu do coração. Desceu a ladeira da Rua General Carneiro completamente apavorado.  O balaio foi para os ares e era pão voando pra todo lado.

        Até morrer, Boi D’água teve de sofrer com as brincadeiras que faziam sobre o ocorrido.