Crônica: Mulheres de Vida

Robledo Carlos (de Divinópolis)

Crônica: Mulheres de Vida
Robledo Carlos é membro da Academia Formiguense de Letras




Queria hoje era mesmo ver a Rute Cortez, uma mulher destemida e guerreira.

Rute Cortez na verdade, se chama Creusa Aparecida, mas como trabalha no bordel, batizou-se de Rute Cortez, acha o nome lindo, se diz cigana,vinda do norte da Espanha.

De certo sei que gosto de Rute Cortez, pois me é a preferida de todas as outras.

Rute tem a pele clara, 1,65 de altura e uns 60 kilos, suponho que tenha uns 45 anos.

Uma bela mulher!

Não sei se é verdadeiramente ruiva, ou tinge os cabelos, só sei que ela é muito formosa.

Rute é uma mulher mística e supersticiosa, tem entre os seios, um pequeno amuleto, um saquinho de tecido, com pequenos pedaços de um olho de lobo, por isso quase nunca mostra os seios, tem medo de perder o amuleto, ela diz que afugenta mal olhado e também doenças venéreas, e se diz mais tranquila.

O bordel estava meio vazio, a música já estava a certa altura e o movimento prometia.

Cheguei e logo pedi um rabo de galo (Vermute, Cynar e cachaça), quem me atende é Dorotéia, uma mulher bem jambo, com que gosto muito de prosear, ela sabe bem a dosagem que gosto, além de ter uma linda voz e uma gargalhada cativante.

Às vezes, cantamos com um violão que fica dependurado abaixo da Santa Margarida de Cortona, a protetora das prostitutas que Dona Dasdor, proprietária do empreendimento, que tem muita fé, se diz protegida fisicamente e abençoa os seus negócios, fervorosamente fiel a santa!

Dorotéia me conta as novidades, com um pano no ombro, olhando pra dose que acabara de me servir.

Contou-me que Seu Jurandir, fazendeiro próspero aqui da cidade, montou uma casa para a Glorinha, Glorinha o nome já diz, é uma baixinha das pernas grossas, usa batons estridentes, vestidos de chita, uma puta de pouca prosa.

Logo chega uma mulher de uns 20 e poucos anos, tinha cara de menina, mas um jeitinho de fogosa. Perguntei quem era pra Doró, chamo Dorotéia de Doró, tenho carinho por ela.

Doró me diz que a menina veio de Patos de Minas, teve um relacionamento conturbado com um rapaz e decepcionada caiu na vida.

Se chama Elaine, que se aproxima de mim e me pede um trago, educadamente deixo a moça pedir a Doró, que lhe serve e vai logo dizendo, pra menina tomar tento, pois eu era cliente da Rute, e Rute não gosta que ninguém mexa em seus guardados.

No balcão junto a mim, está Esmeralda, alta, olhos verdes, morena clara, um mulherão, mas que tem dois defeitos, bebe e fuma muito, por isso nunca fiquei com Esmeralda.

Até achei bom, o que Doró disse a Elaine, que logo saiu de perto de mim e foi logo para junto de um rapaz no fundo do salão.

Fiquei ali apreciando o movimento e Rute chega toda perfumada e linda numa querência só.

Tinha os olhos lindamente contornados com lápis, e usava um perfume cítrico bem suave, as pernas estavam expostas debaixo de um vestido amarelo claro, em verdadeiro quadro tropical.

As meninas já tinham seus pares, faltavam umas cinco arrumarem algum engastalho.

Pedi outro rabo de galo, e uma dose de Campari para a Rute.

Notei o rapaz que estava com a Elaine, discutindo com outro rapaz, eu pensei logo que isso não ia prestar!

Só vi que começou uma quebradeira danada, era mesa e copo pra todo lado e ouvi quando alguém disse;

- De faca não!

Opa, eu que não gosto muito de metais, logo pensei, não gosto de lâminas, ainda mais cortantes, tenho uma cicatriz de 15 cm na barriga de uma cirurgia que fiz anos atrás, não quero mais, isso se tiver sorte de não morrer.

Virei minha dose guela abaixo, limpei a boca com as costas da mão e falei que amanhã pagaria as doses para a Dorotéia, dei um beijo na Rute e casquei fora, vou jogar sinuca no Tropical que é mais negócio.

Elaine safadinha ainda me mandou um beijo!

A vitrola colorida tocava:

"Eu vou tirar você desse lugar".

Eu segui a letra, talvez fosse uma intercessão ou até mesmo uma mensagem de Santa Margarida de Cortona.

Valeu-me santinha!