Crônica: O Agradecimento da Romãzeira
Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho

Nós a salvamos, e ela, em flor, nos agradece.
Era apenas uma árvore, diriam alguns. Uma romãzeira plantada sem alarde, que cresceu no compasso dos dias, entre o passeio e a promessa de uma construção. Mas, para nós, ela era mais do que galhos e folhas – era símbolo. Testemunha silenciosa de um tempo que resiste, mesmo quando tudo parece querer apagá-lo.
O destino parecia selado. A obra pedia pressa, espaço, avanço. E ali, bem no meio do caminho, a romãzeira era obstáculo. Sacrifício certo, nos disseram. O engenheiro era o progresso. O corte, a sentença.
Mas pedimos – não por capricho, nem por teimosia, mas por respeito. Apelamos ao mestre de obras, homem de mãos firmes e nome curioso: Japão. Ele nos escutou com a serenidade dos que já viram muita coisa tombar. Olhou a planta da construção, examinou o terreno e não prometeu nada. Apenas disse: “Vamos ver o que dá pra fazer.” E, naquela frase simples, morava uma esperança.
E a esperança vingou.
Contornaram a árvore. Redesenharam um trecho. Ajustaram aqui, cederam ali. E ela ficou. Silenciosa, serena, como quem entende que viver é também saber esperar.
O tempo passou, e o que parecia risco virou milagre no Jardim Aclimação, em Passos. A romãzeira floriu. Não apenas sobreviveu – ela floresceu. Como quem oferece gratidão sem palavras, nos presenteou com flores e frutos. Romãs vermelhas, redondas, repletas de sementes como corações pequeninos – um brinde à vida que persiste.
Hoje, quando passo por ela, penso nas batalhas que vencemos sem barulho, nas resistências que não saem no jornal. A romãzeira permanece ali, no meio da construção, como uma oração em pé entre o concreto e o céu. Uma lembrança viva de que o gesto de salvar, mesmo quando tudo aponta para o fim, pode devolver ao mundo a beleza que ele nem sabia que corria o risco de perder.
Ela sobreviveu. Mas, no fundo, quem foi salvo... fomos nós.
E que seja essa romãzeira o símbolo de tantos seres vegetais que, silenciosamente, sustentam a vida. Sem as árvores, sem as folhas, sem o milagre verde da fotossíntese, nada seríamos. São elas, as plantas, que respiram por nós, nos alimentam, nos curam, nos abrigam. São elas que, mesmo caladas, ensinam a paciência, a entrega, a renovação.
A botânica não é apenas ciência – é reverência. E, diante dessa romãzeira que floresceu contra o destino, curvamo-nos com humildade diante do universo vegetal. Porque, em última instância, somos ramos de um mesmo tronco. E é por elas, com elas e graças a elas... que continuamos. E vamos.