Crônica: O CASO DO PREGO
Amilton Luiz Vale (de Formiga)

Juro que não foi fácil. Acabei passando a noite quase que só escutando o Mendes. Fiquei encabulado porque acabou achando que a vidinha de quase todo mundo é igualzinha. Só mudam os nomes.
A gente nunca foi de beber, mas acabamos acabando com um litrão de uísque. A tontura era necessária pra tentar levantar o ego do amigo e conseguir dar a mão.
Vou pular os detalhes. Sua vida começou difícil. Pais pobres, tão logo os padres se livraram dele (ou ele se livrou dos dito cujos) foi preciso caçar jeito de ajudar a botar comida na panela.
Sua sorte foi a bagagem do internato que o fez virar professor. E virou.
Mendes estava despreparado para o mundo do sexo - afinal, de saia só entendia a dos padres.
Logo no primeiro ano, acabou se enroscando com uma gatinha dessas de parar mercado. Engravidou a danadinha e teve de se casar às pressas. Vontade de detalhar, mas o mundo odeia texto grande.
Guinada boa na vida. Não bastasse a premente necessidade dos pais, agora virou pai de família Acabou que se acostumou com a coisa e virou pai de três.
Daí, tudo bem, acabou conseguindo dar rumo a todos. Os pais mudaram rápido de endereço e foram pro papai do céu.
Agora? Já aposentado com merreca de professor, casa vazia, só tem como parceiro um bendito prego que fica de espia na parede de seu quarto. Pena que o prego só escuta, não serve de companhia.
A patroa? Ora, a patroa... Despreocupou do coitado faz tempo. Até desconfia que se encostou num amante. Será? O caso dos dois foi engolido pela pressa da vida. Continuam juntos. Ele pra lá, ela pra cá.
Acabou que o Mendes deu uma folga no monólogo e eu arrisquei: amigo, foda-se tudo! Esqueça o prego da parede e chute o balde!
Termino o caso. O Mendes, acreditem, seguiu à risca o meu foda-se. Buscou no fundo do baú uma antiga paixão - a Rita - a achou prontinha pra uma fugida, os dois juntaram as trouxas e ele nem deu adeus pro prego.
Curioso pra saber pra onde Rita e ele se foram? Se eu contar, o caso perde a graça.