Crônica: Shine a Like Star
AC de Paula (de São Paulo)

É maravilhoso andar de transporte público em uma manhã chuvosa que lembra a antiga São Paulo da Garoa, às oito da manhã eu entro no metrô na Estação Santa Cruz e caminho ao Fórum do Lalau na Barra Funda. E como é de se esperar, vou é claro, confortavelmente apertado.
A mocinha com traços orientais senta-se no banco azul claro onde acima se lê “PREFERENCIAL”. Estrategicamente, ela sequer levanta a cabeça nem o olhar.
Fingindo estar alheia aos demais passageiros do vagão, ela saca da bolsa uma necessaire cor de rosa onde se lê "Shine a like star", e dela retira um tubo de creme, espalha um bocado nas mãos e lentamente vai passando por todo o rosto. Devolve o creme à necessaire e pega um outro. Com as pontas dos dedos, vai colocando creme em algumas espinhas, não deve ter mais que dezoito anos, se tanto.
A voz no alto falante anuncia que há problemas na Estação Santana, por isso a maior demora nas estações e a velocidade reduzida.
Eu fico imaginando que realmente é bom que ela desfrute agora do privilégio do assento preferencial, afinal vai que ela não consiga alcançar a idade mínima para dele usufruir sem precisar fazer teste público para atriz.
Terminada a maquiagem, ela devolve a necessaire à bolsa, no Paraíso vaga um lugar azul escuro na janelinha junto ao banco azul claro e ela ainda sem levantar o olhar muda de lugar.
Eu me sento, nas mãos tenho uma pasta L de plástico azul, não tenho espinhas, e muito menos uma necessaire rosa escrito "Shine a like star".