Opinião: Ela cobra dele alimentos gravídicos, mas ele nem sabe se é o pai da criança
Maria Lucia de Oliveira Andrade (de Formiga/MG)

Estou em uma reunião de família, quando ele me pega pelo braço e me leva para um canto, dizendo que precisa falar comigo em particular. É meu primo, o mais namorador de todos os homens. Sua simpatia, desde bem jovem, fazia as meninas irem em direção a ele como moscas atraídas por açúcar. Pensei: “Lá vem bomba!”
Ele me conta que uma jovem com quem acampou no Carnaval deste ano engravidou e, tão logo soube da gravidez, procurou-o, afirmando ser ele o pai. “Ora, ora, pois, pois...” – brinca ele, cheio da certeza inconsequente da juventude – não era a primeira vez que tentavam laçá-lo nem seria a última... É claro que não deu ouvidos a ela e a despachou num piscar de olhos.
Porém, ela não desistiu e ajuizou uma ação contra ele, requerendo alimentos gravídicos. Pergunta-me como pode ser possível uma ação dessas contra ele se ninguém sabe quem é o pai da criança.
Pergunto a ele se apenas acamparam juntos, ou se namoraram por algum tempo. Ele se esforça por me dizer que não foi um namoro, foi apenas um “casinho”, mas sigo firme na pergunta, e ele me diz que estiveram juntos por três meses antes do acampamento. Pergunto se chegaram a ser fotografados juntos nessa época, se foram publicadas, nesse período de três meses, fotos dos dois nas redes sociais, se amigos deles sabiam do relacionamento... Sem entender meu interesse nesses aspectos, já que nada disso é prova de que ele é o pai da criança, responde sim a todas as minhas perguntas.
Então, explico-lhe que, tendo ocorrido a concepção nessa época, esses são aspectos que podem ser considerados indícios de paternidade. Certamente a jovem apresentará ao Juízo essas evidências, além de, por exemplo, prints de conversa dos dois pelo WhatsApp e depoimentos de testemunhas, demonstrando que, à época em que engravidou, os dois estavam juntos.
Com base nisso, mesmo que não se tenha certeza se ele é o pai da criança, o Juízo poderá considerar procedente o pedido feito. Reconhecidos em Juízo esses indícios, ele terá, sim, de arcar com os alimentos gravídicos. Esses alimentos são requeridos pela gestante quando o suposto pai da criança se nega a ajudá-la a custear despesas com consultas e exames médicos, assistência psicológica, parto e mesmo com a preparação do enxoval do bebê. Servem para cobrir despesas adicionais relacionadas à gestação.
O valor será calculado de acordo com três critérios: a necessidade da gestante, a possibilidade dele de arcar com o pagamento, e a razoabilidade, isto é, não pode ser baixo a ponto de não custear as despesas, nem alto a ponto de onerar demais quem paga.
Ele esbraveja, esquecido de que isso atrai olhares para nós: “Então, eu vou pedir um exame de DNA! Quero que seja feito o mais rápido possível!”
Digo-lhe que se faz esse exame após o nascimento, pois, antes, pode gerar risco ao feto. Ele poderá, quando a criança nascer, ingressar com uma ação negatória de paternidade e realizar o exame. Se ficar confirmado que é ele o pai, os alimentos gravídicos serão convertidos em pensão alimentícia para o filho.
Ele continua inconformado: “É um absurdo pagar despesas de uma pessoa que nem sei se está falando a verdade!” Explico, pacientemente, que a Justiça protege os direitos do nascituro – para que nasça saudável, a mãe precisa ter assistência.
“E se o exame de DNA comprovar que eu não sou o pai? Ela terá de me devolver o que eu paguei?” Deixo-o à beira do surto com minha resposta: os alimentos gravídicos são irrepetíveis, isto é, não podem ser restituídos. Para conseguir uma restituição, nesse caso, ele teria de ajuizar uma ação indenizatória contra a mãe da criança e provar que ela agiu de má-fé, ou seja, que moveu uma ação judicial contra ele mesmo tendo certeza de que ele não era o pai, ou que agiu com negligência: não tinha certeza se ele era o pai, mas o processou, mesmo assim.
Se ele perceber que não conseguirá provar essa conduta ilícita, um possível caminho para que tenha restituídos os valores pagos será buscar um acordo com ela. Não havendo esse acordo, ele poderá ajuizar uma ação contra o verdadeiro pai da criança, assim que ele for identificado, requerendo a devolução.
“E se ela não tivesse ajuizado agora essa ação de alimentos gravídicos? Teria como pedir isso depois que a criança tivesse nascido?” Teria, sim. Mesmo quando os alimentos gravídicos não são fixados anteriormente ao nascimento, podem ser requeridos. Nessa situação, a mãe da criança vai ajuizar uma ação de cobrança para que lhe sejam ressarcidos os gastos médicos, hospitalares e de enxoval, correspondentes às despesas efetuadas durante a gestação.
Alguns parentes que acabaram de chegar se aproximam de nós dois, interrompendo nossa conversa. Vejo-o afastar-se tomado pelo braço por um deles, esforçando-se por relaxar e esquecer, momentaneamente, a nuvem que pairou sobre sua cabeça. Terá de enfrentar essa nuvem, de arcar com as consequências de sua inconsequência.