Opinião: O ex-inquilino deve, não nega, mas não paga
Maria Lucia de Oliveira Andrade (de Formiga/MG)

Por mais de seis meses, ela tentou que seu devedor quitasse o valor correspondente à dívida assumida devido a um contrato de locação de um imóvel residencial. O aluguel dessa casa completava sua renda, por isso, quando o locatário deixou de cumprir a obrigação de pagamento, teve de se organizar para reduzir suas despesas. Não bastasse isso, ele, diante das cobranças feitas por ela, deixou o imóvel sem nenhum aviso prévio e sem quitar as prestações devidas.
Por causa disso, não lhe restou alternativa a não ser ajuizar uma ação de execução de título executivo extrajudicial. O contrato de aluguel é um título executivo extrajudicial, pois é um crédito documentalmente comprovado decorrente do aluguel e das taxas e despesas de condomínio (se for caso de condomínio), as quais são encargos típicos da locação.
Tentaram, várias vezes, localizá-lo para que fosse citado, mas foi inútil. Então, foi preciso citá-lo por edital. Ele foi intimado para pagar a dívida, porém não se manifestou.
Começou para ela a peregrinação em busca da quitação total do débito.
Foram várias as diligências autorizadas em Juízo para que se localizassem bens existentes no nome dele. Entre elas, foi requerido ao Juízo o bloqueio de bens dele, via SisbaJud (sistema que conecta o Poder Judiciário às instituições financeiras), de valores depositados nas contas bancárias dele, e via RenaJud (sistema que permite consultar e bloquear veículos em nome do devedor).
Também foi pedido o bloqueio de bens via InfoJud (sistema que permite ao Judiciário o acesso a declarações de imposto de renda. Nestas, podem ser identificados os bens de propriedade do declarante).
Infelizmente, o valor localizado e bloqueado nas contas bancárias não supria nem 5% do montante devido. Também não foram localizados veículos e outros bens no nome dele.
Ela está inconformada. Ele não paga a ela, mas ostenta uma vida de luxo. Publica, frequentemente, fotos das viagens internacionais que faz, dos hotéis luxuosos em que se hospeda, das refeições em restaurantes famosos dos lugares que visita e de passeios em barcos. Nas fotos, está sempre acompanhado pela mesma mulher, que, pelo que soube no tempo em que ele foi seu locatário, é sua companheira há cerca de cinco anos.
Ela me conta isso durante uma conversa longa que há muito não tínhamos. Veio à cidade passar o Natal com seus familiares e aproveitou para me visitar. As festas de final de ano propiciam esses momentos preciosos de reencontro com amigos.
Pergunto-lhe se ela chegou a requerer ao Juízo a penhora de bens da companheira dele. Ela me diz que não.
Então, sugiro que converse com o advogado que contratou. Ele poderá fazer esse requerimento, alegando que as postagens feitas pelo devedor nas redes sociais ostentam sua união estável e sua vida de luxo. Estando evidenciada publicamente e comprovada a união estável, pode ser pedida essa penhora. É que ele tem direito a 50% do patrimônio adquirido na constância da união estável. Assim, mesmo que os bens tenham sido adquiridos apenas por ela, ele tem esse direito.
Pertencendo a ele a metade desses bens, o montante equivalente à dívida poderá ser penhorado para a quitação. Se o montante da dívida ultrapassar os 50% a que ele tem direito, serão penhorados apenas esses 50%, não se retirando nada dos 50% pertencentes à companheira.
Ressalto que não será possível essa penhora se ele e a companheira tiverem um contrato escrito, assinado pelos dois e registrado em cartório, ou feito por meio de escritura pública em Tabelionato de Notas, formalizando a opção deles pelo regime da separação total de bens. Se os dois tiverem escolhido esse regime, nada que houver sido adquirido pela companheira na constância da união estável pertencerá a ele. Infelizmente, nesse caso, a peregrinação dela continuará.
Não sendo encontrado nenhum bem passível de penhora, o processo poderá ser suspenso até que se localizem bens penhoráveis ou seja determinado pelo Juízo a prática de algum ato processual, quando poderá ser requerida, por exemplo, nova consulta ao SisbaJud. É importante que o advogado dela esteja atento para evitar a prescrição interior do processo. Precisará movimentá-lo; caso contrário, se nada for feito, poderá ser arquivado.
Ela me agradece a sugestão. Fico torcendo para que tenha êxito e consiga receber o que lhe é devido.