Opinião: SOBRE CONCLAVES

Frei Betto (de São Paulo/SP)

Opinião: SOBRE CONCLAVES
Frei Betto Escritor e educador popular, autor de “Jesus rebelde – Mateus, o Evangelho da ruptura” (Vozes), entre outros livros.




Conclave, palavra que deriva do latim cum clave, significa “com chave”, uma vez que os cardeais eleitores ficam trancados no Vaticano até elegerem um novo papa.
O sistema de eleição, tal como conhecemos hoje, foi instituído em 1274, durante o Concílio de Lyon II, pelo papa Gregório X. A motivação foi o conclave que o elegeu, o mais longo da história, em Viterbo. Durou 33 meses, quase três anos (1268 a 1271). Os cardeais se dividiam entre facções políticas, partidários dos angevinos (pró-França) e dos gibelinos (pró-Sacro Império Romano-Germânico).
Isso causou o impasse prolongado, e tanta frustração e revolta, que a população local trancou os cardeais no palácio episcopal e, no início do inverno, removeu o teto e restringiu a entrada de alimentos para forçá-los a apressar a escolha do novo pontífice.
O eleito, Gregório X (1271-1276), criou então regras para tornar o processo mais rápido e eficiente, como isolamento dos cardeais; restrição de contato externo; redução gradual de conforto (menos refeições); exigência de maioria qualificada (2/3) para a eleição, de modo a pressionar a decisão.
A eleição dos papas já era feita por cardeais desde 1059, por iniciativa do papa Nicolau II, mas não havia um sistema fechado nem regras tão definidas. O processo podia durar meses, envolver influência externa (sobretudo de reis e imperadores), e ser bastante caótico.
O conclave mais breve da história da Igreja Católica, realizado na Capela Sistina, foi o que elegeu o cardeal Eugenio Pacelli, ex-núncio na Alemanha nazista, papa Pio XII. Durou apenas 24 horas, com três votações realizadas no mesmo dia 1º de março de 1939 por 62 cardeais.
Outro conclave longo foi o que elegeu Celestino V. Morto Nicolau IV, em 1292, cardeais italianos e franceses fizeram do conclave arena de disputas pelo poder, movidos mais por interesses políticos que pelas luzes do Espírito Santo. Após dois anos e três meses de impasse na eleição do novo papa, Pedro Morrone, eremita italiano, de sua caverna nas montanhas enviou carta aos cardeais, instigando-os a não abusar da paciência divina. O conclave viu na carta um sinal divino e decidiu fazer do monge o novo chefe da Igreja. Pedro Morrone relutou, não queria abandonar sua vida de pobreza, solidão e silêncio, mas os prelados o convenceram de que o consenso em torno de seu nome tiraria a Igreja do impasse.
Com o nome de Celestino V, tornou-se papa em agosto de 1294. Menos de quatro meses depois, a politicagem vaticana o levou ao limite de sua resistência. E levantou a pergunta inesperada: posso renunciar? O colégio cardinalício não se opôs e, numa bula histórica, Morrone justificou-se, alegando que deixava o trono de Pedro para salvar sua saúde física e espiritual. A 13 de dezembro do mesmo ano retornou à solidão contemplativa nas montanhas. Vinte anos depois foi canonizado, exaltado como exemplo de santidade. A 19 de maio a Igreja celebra a festa de São Pedro Celestino.
Antes de Celestino V, o papa Gregório XII renunciou em 1415 para facilitar a resolução da crise durante o Grande Cisma do Ocidente, quando três papas estiveram à frente da Igreja.
O terceiro papa a renunciar foi Bento XVI, em 2013, devido à idade avançada e falta de alento. Intelectual, Ratzinger vivia o conflito entre sua afeição à teologia e as exigências de administração da Igreja.
Pressinto que o conclave responsável pela eleição do sucessor de Francisco não será tão rápido quanto os que elegeram Ratzinger e Bergoglio, que não ultrapassaram 48 horas. Mas sobre isso escreverei em seguida.